O Português e A Matemática
Tenho observado na prática de
minhas aulas o que já se sabe em teoria: a maioria das pessoas que gosta de
matemática não gosta de português, assim como a maioria das pessoas que gosta
de português detesta matemática.
Mas penso que a maioria ainda não
descobriu o quanto ambas são parecidas. Exatamente porque ambas são línguas.
Por sua importância e substancialidade, os números da matemática
equivalem perfeitamente aos substantivos do português e por sua vez são ao mesmo
tempo numerais.
Na matemática, os ordinais não
acrescentam muita coisa, pois em algumas operações a ordem dos fatores não
altera o produto, e como é bom quando em português conseguimos um abraço
igualitário entre o primeiro e o último em um pódio ou quando comprovamos no cotidiano
que “os últimos serão os primeiros”.
Por sua característica acionária e sua capacidade de mudar a tudo, os
sinais da matemática são os verbos do português e são primos imediatos dos
sinais de pontuação também, pois a vírgula não é muito diferente de diminuir as
emoções e abreviar os sentimentos, assim como o ponto final é a última divisão
a separar uma adição anterior.
Na matemática temos a perfeição
onde 1 + 1 é igual a 2 e nesse ponto eu entendo a rejeição dos céticos e a
dificuldade de entendimento dos pouco subjetivos, uma vez que no português 1 +
1 pode ser igual a 1 ou ainda a 3, 4 ou mais. Mas quanta perfeição há nisso
também em tornar duas pessoas uma só ou em multiplicar.
E por falar em ou, esse,
aparentemente, poderia ser uma grande disparidade entre português e matemática,
talvez até a maior. Mas é apenas aparência. O ou da matemática é agregador, é
conciliador, lembremo-nos das estatísticas, isso ou aquilo se torna uma soma. Ao
passo que no português o ou é desagregador, isso ou aquilo se torna uma escolha
em que uma só das coisas é viável. Mas felizmente a poesia e a música veio a
nos provar que é apenas uma aparência e com sua cauta lucidez nos mostrou que,
como pode ser definido com as palavras de “Los Hermanos”, “não te dizer o que
penso já é pensar em dizer”. Assim, quando uma soma é dividida e um dos elementos
diz que não ama mais é porque ainda cogita amar, é porque ainda pensa: amo ou não
amo. E não é uma escolha, uma dicotomia a segregar, no fundo é um pensar que
coaduna emoção, razão, passado, presente, futuro tornando as duas variáveis
reais, uma vez que ainda se pensa na possibilidade de amar (pela história
vivida, pelo carinho contido, pelas lembranças, como um amar latente, dormente)
e, também, admite uma nova possibilidade de não se amar pelos novos rumos e
rumores impostos pelas razões mais diversas.
Mas português e matemática
confluem na tentativa quase vã que o ser humano traz consigo de se fazer
entendido por outro, mas se na matemática os parênteses causam dúvidas aos
pouco experientes sobre que expressões utilizar primeiro, os parênteses do
português e da vida causam dúvidas até aos mais experientes em pensar o que
surgiu primeiro: a dúvida, o parêntese razão do mal estar, ou a adição capaz de
tornar 1 + 1 = 1. E explicar esses parênteses é um terreno árduo, pois, muitas
vezes, o que era explicação de um amor, pode se tornar complicação e dissabor, o
que era pedido e diálogo, torna-se discussão e algo é perdido.
E pensando nisso tudo, acho que
começo a entender quem não gosta de português e prefere a matemática, pois por
não podar bem a “última flor do Lácio”, pode ser que não cuidemos e percamos nossa
flor de maio.
Uma crônica
dedicada aos estudantes que frequentemente preferem português à matemática e
vice-versa e também dedicada a todos os casais e amores que se perdem nas
sinapses imperfeitas de nossa comunicação.
Rodrigo Brioschi